Dossiê: Outro Olhar

Uma crônica sobre o Zoológico de BH, lembranças da infância e a suspeita de que os animais não estão muito felizes

Por Ana Carolina Fontana

 

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Quando se tem menos de 15 anos de idade e se faz um passeio pelo zoológico de Belo Horizonte, muitos aspectos chamam a atenção. A diversidade de espécies, o tamanho e as características de cada animal – tudo é impressionante. Basta um rugido do leão para que diversas crianças corram ao redor do recinto, procurando de onde vem o som tão forte e feroz.

O passeio e a longa caminhada pelo local despertam a curiosidade, o interesse e a alegria de centenas de pessoas que visitam diariamente a Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte. O local recebe excursões de diversas instituições públicas e privadas da capital mineira e da região metropolitana.

Porém, a sensação é diferente quando voltamos ao zoológico aos 21 anos de idade, como no meu caso. Não me lembro da última vez em que tinha ido ao local, mas as vagas recordações que tenho são bastante distintas do que vi naquela manhã. Os animais já não me trazem encanto, mas, sim, demonstram uma sensação de abandono e aprisionamento.

Na chegada ao zoológico, uma das primeiras atrações é o recinto dos felinos. Os tigres, onças pintadas e leões não pareciam dar a mínima atenção aos visitantes que se apoiavam nas grades buscando o melhor ângulo para fotografá-los. Muito menos se importavam com as crianças, que, em fila indiana, eram aconselhadas pelas professoras a não gritar ou jogar comida para os animais.

As condições dos recintos definitivamente não são boas. Os muros estão degradados, as grades, enferrujadas, e a grama, que acabou se tornando um matagal, precisa ser aparada.

Na área dos primatas a situação não é diferente, a não ser pela cerca elétrica no topo das árvores do recinto dos chipanzés. Perguntado sobre o motivo da proteção, José, vigilante do zoológico há mais de três anos, explicou que o mais “levado” deles certa vez escalou a árvore e pulou para fora de sua morada. Segundo o vigia, a fuga não durou muito tempo e logo o chipanzé voltou por conta própria ao recinto, após jogar lá dentro alguns cocos que estavam em uma lixeira próxima. É inevitável que o acontecimento inusitado nos leve a pensar no motivo da fuga e ter a certeza de que estar preso em um local, ainda que espaçoso, não é agradável para um animal que deveria estar livre na natureza.

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O nível de estresse em algumas espécies é alto. Um dos macacos-prego dava inúmeras voltas ao redor da mesma árvore, onde era possível ver as marcas na grama formando uma espécie de trilha. Enquanto isso, seus outros dois companheiros retiravam pedaços de cimento do recinto e batiam no chão, ao mesmo tempo em que pulavam e se perseguiam em uma tentativa de chamar a atenção dos visitantes. Ao contrário dos chimpanzés, somente um lago ao redor do recinto prendia os macaquinhos. A cerca baixa não impediria uma fuga, a menos que eles não quisessem ou não soubessem como escapar.

Nada disso tem importância para as crianças que por ali transitam, pois estão impressionadas mesmo é com os animas que só tinham visto antes pela televisão. A inocência e o sorriso estampado em seus rostos trazem alegria ao ambiente.

As péssimas condições dos viveiros das aves também chamam a atenção. Os recintos eram pequenos, as telas enferrujadas e apenas uma telha de amianto protegia os animais da chuva ou do sol escaldante. Vários recintos nem sequer tinham identificação. Já outros abrigavam espécies diferentes. Um casal de araras vermelhas namorava enquanto as azuis escalavam a tela de proteção em frente a uma placa comemorativa à última reforma dos viveiros, realizada em 1995.

Desde sua inauguração em 1959, o zoológico de Belo Horizonte sofreu algumas modificações. Em 1991, foi criada a Fundação Zoo-Botânica, entidade responsável pela administração do Jardim Zoológico, Jardim Botânico e o Parque Ecológico Francisco Lins do Rego.  Hoje, o espaço conta ainda com o Jardim Japonês, o Aquário e outras atrações – mas a necessidade de uma melhora em sua estrutura é nítida.

Mas nem tudo mudou, e o zoológico traz várias lembranças. Difícil ir ao local e não sentir falta, por exemplo, do gorila Idi Amim, que faleceu em 2011. Ou deixar de passar no quiosque de sorvetes Kibon que há anos está ali, bem como outras barraquinhas de cachorro-quente e pipoca. Há aspectos que nem as reformas conseguem mudar.