Como o jogador saiu de queridinho do país para uma das personalidades mais criticadas do país?
Por Lucas Sant’Ana e Gabriel Barcelos
Em meados de 2011 e 2012, era praticamente impossível ligar a TV, o rádio ou pegar um jornal e não ver esse cara:
Neymar Júnior era uma estrela ascendente no futebol brasileiro, prenunciando uma escalada meteórica no futebol mundial. O garoto pupilo, que também surgiu na Vila Belmiro, parecia o sucessor espiritual do próprio Pelé, era imparável e seu futuro, glorioso. Não haviam jornais, tablóides, jovens ou adultos que não olhassem para esse garoto ligeiro e não sorrissem, confiantes de que um novo craque estava nascendo. Em pouco tempo, sua figura transcendeu a área futebolística e o jovem se fez uma celebridade.
Mas como uma personalidade dessa magnitude e com tanta admiração encontra-se hoje no pior momento de sua carreira profissional e com diversas críticas em relação a suas posturas e caráter?
A receita de todos os craques
A primeira vez que Pelé foi chamado de Rei foi numa crônica de Nelson Rodrigues em 1958 quando ele escreveu sobre a postura inigualável do jogador em campo. E todos conhecem o resto da história do maior craque brasileiro de todos os tempos.
O futebol é um campo de histórias como estas. É uma cultura que sobrevive da poesia de seus craques, dos lances mitológicos de seus astros e que precisa alimentar, cultivar e criar esses personagens que deixam de ser meros jogadores quando assinam o primeiro contrato profissional. Pelé não foi o primeiro e está muito longe de ser o último, ele é um exemplo brilhante dessa necessidade do esporte, do público e da mídia de projetar os holofotes da idolatria para alguém..
Não é atoa que a torcida brasileira cantou na copa de 2018 “Em 58 foi Pelé… Em 62 foi o Mané… Em 70 o esquadrão, primeiro a ser tricampeão. Em 94, Romário, 2002, Fenômeno, primeiro tetracampeão… O único penta é o Brasilzão”.
Com tempo suficiente, essa necessidade do espetáculo e das personagens acaba revelando as contradições de ser uma grande figura midiática futebolística. Nos momentos de glória o atleta é uma lenda viva. Já nos momentos de derrocada, o jogador torna-se apenas uma decepção vazia, um brinquedo que já não serve mais. Pelé passou por isso. Ronaldo também. E haverão muitos outros para emoldurar capas de revistas, enfáticas e contundentes.
Claro que esses jogadores estão muito longe de serem vítimas numa história de controle de imagem e poder. Por trás do verniz e da glória, são seres humanos longes do ideal no qual a mídia e o imaginário o coloca. São pessoas que podem também se aproveitar dessas imagens que são geradas de si mesmos e surfar na fama e nas bênçãos que ela traz.
A indústria do futebol e a mídia que a acompanha cria e financia esses personagens. E por isso, acompanhá-los é no mínimo interessante. Como é o caso de uma da figura que dá título a essa matéria, uma das últimas a protagonizar os holofotes; um menino pródigo comparado ao próprio Rei, mas que tropeçou no próprio manto e na própria soberba.
O surgimento de um novo prodígio
Depois da decepção da copa de 2006 e com grandes nomes do pentacampeonato mundial com cada vez menos espaço na seleção, as pessoas sentiam falta de novos jovens de muita qualidade no futebol brasileiro.
Em 2009, o time do Santos estava com uma geração de jogadores muito interessantes saindo da base, entre eles Neymar da Silva Santos Júnior, que subiu para o profissional naquele ano e já havia quebrado alguns recordes relevantes.
Mas foi em 2010 que o jogador santista despontou de vez. Ganhou um campeonato paulista e uma Copa do Brasil, competição na qual foi artilheiro. Naquele ano, ele marcou 42 gols na temporada, ainda com menos de 18 anos, números assustadores.
Não demorou muito para ele chamar atenção de vários fãs de futebol e já na Copa de 2010 haviam pessoas que pediam a presença de Neymar naquele mundial. Depois dessa temporada, o futebol do jogador parecia evoluir a cada partida e aquele elenco do Santos era quase imparável. Tornando-se assim um dos times
mais icônicos do futebol brasileiro nos últimos anos. Em 2011, para coroar os bons desempenhos, o clube foi campeão da Libertadores. Neymar marcou um gol na final, foi eleito o melhor jogador do torneio, ganhou o prêmio de gol mais bonito do ano e foi eleito o décimo melhor jogador do planeta. Tudo isso enquanto ainda jogava na América do Sul.
Como o começo de carreira do jogador foi meteórico, o tratamento por parte da mídia era geralmente de muita empolgação, esperança do mesmo se tornar um dos maiores futebolistas do mundo e o principal nome da Seleção Brasileira. Tão louco era o fascínio com o menino prodígio que ela já aparecia como um novo Pelé dessa geração, quase um messias da Seleção Brasileira do século XXI.
Não demorou muito para que todo esse sucesso dentro do mundo do futebol atingisse outros públicos. O jogador começou a participar de diversas campanhas publicitárias, programas de tv, entrevistas, o que fortaleceu e fermentou ainda mais sua imagem.
A fama de Neymar crescia de forma exponencial. O fato de ele ainda estar no Brasil naquela época fazia com que os fãs se sentissem mais próximos dele. Qualquer coisa que o jogador fizesse gerava multidões e diversas reportagens. A fama e influência era muito grande, principalmente entre os garotos mais jovens que imitavam o estilo e cortes de cabelos do jogador.
Mas, já naquele período, o comportamento do jogador sofria algumas críticas por parte da imprensa. Muitos apontavam o jogador como mimado, infantil, imaturo e “cai cai”.
O maior episódio de repercussão negativa em relação a essas acusações foi quando em 2010, em uma partida contra o Atlético-GO, o técnico da equipe fez duras críticas ao atleta:
Quando Neymar saiu do Santos em 2013, após ser negociado com o Barcelona pelo expressivo valor de 88 milhões de euros, ele inquestionavelmente era o melhor jogador em atividade em solo brasileiro e o mundo inteiro tinha grandes expectativas em seu futebol. No total, ele atuou no clube Paulista por quatro temporadas, bastante tempo se comparado aos dias atuais, em que os atletas já aos 18 anos saem para Europa.
Porém, havia muitas dúvidas em relação à adaptação de Neymar ao futebol Europeu. No Brasil, pouquíssimos defensores eram capazes de pará-lo, mas em seu novo desafio, ele enfrentaria os melhores profissionais do ramo e perderia o papel de principal estrela que ocupava no Santos, já que atuaria junto a Lionel Messi, dono de quatro bolas de ouro até aquele momento.
Em paralelo, nessa mesma época, o jogador começou seu relacionamento com a atriz Bruna Marquezine. Assim, acabou sendo mais um passo do jogador em direção ao mundo das celebridades e fofocas.
O começo em copas do mundo
Em 2010, Dunga, então técnico da seleção, optou por não levar Neymar àquela copa do mundo, mesmo com uma certa pressão por parte da imprensa e do público.
Nos anos seguintes, o jogador começou a ser convocado com frequência para a seleção brasileira e participou de todo o ciclo até 2014 para a copa que seria sediada no Brasil.
A última vez que o país havia sediado o torneio, foi em 1950. Na ocasião, a Seleção Brasileira foi derrotada pelo Uruguai em pleno Maracanã lotado. Assim, o objetivo era ganhar a competição e expurgar esses fantasmas do passado. Para isso, Neymar, camisa 10 da equipe e referência técnica do grupo, era a maior esperança de uma geração que não forneceu muitos companheiros para dividir esses protagonismo.
A campanha foi mediana, mas o Brasil chegou à semifinal contra a Alemanha naquela copa. E no jogo das quartas de final, Neymar sofreu uma dura joelhada nas costas e acabou fora do jogo da fase seguinte..
Imagem: Neymar JR. na capa do jornal Correio Braziliense
O jogo contra os alemães foi um fiasco absoluto e ficou marcado como a derrota mais humilhante da história das copas.
Auge no futebol europeu
Após uma primeira temporada de adaptação, Neymar, junto de Messi e Suárez, participou de um dos trios mais icônicos da história do futebol moderno, o trio “MSN”. Em 2015, o Barcelona ganhou a Champions League, a única que venceu na carreira. O jogador ficou empatado na artilharia do campeonato com Messi e Cristiano Ronaldo, os dois melhores da geração. Com isso, ele terminou em terceiro na bola de ouro, encantou diversas pessoas em todo mundo com seu estilo de jogo ofensivo e driblador.
Em seus quatro anos de clube, ele venceu diversos títulos de relevância e era apontado por muitos como um possível sucessor de Messi.
Auge no futebol europeu
Após uma primeira temporada de adaptação, Neymar, junto de Messi e Suárez, participou de um dos trios mais icônicos da história do futebol moderno, o trio “MSN”. Em 2015, o Barcelona ganhou a Champions League, a única que venceu na carreira. O jogador ficou empatado na artilharia do campeonato com Messi e Cristiano Ronaldo, os dois melhores da geração. Com isso, ele terminou em terceiro na bola de ouro, encantou diversas pessoas em todo mundo com seu estilo de jogo ofensivo e driblador.
Em seus quatro anos de clube, ele venceu diversos títulos de relevância e era apontado por muitos como um possível sucessor de Messi.
Mas, em 2017, mesmo em um momento mágico no Barcelona, o jogador recebeu uma oferta astronômica do clube francês Paris Saint Germain (PSG) e optou por sair da equipe Catalã. A transferência girou em torno de 222 milhões de euros. Com isso, a venda do atleta é a mais cara da história do futebol e a primeira e única a bater a casa dos 200 milhões.
Na época, a equipe parisiense, propriedade da família real do Catar, investiu uma quantidade massiva de dinheiro para elevar o prestígio da equipe a nível europeu. Dessa forma, Neymar, era a cara do projeto e, naquele momento, alguns veículos especularam que ele optou pela transferência para sair da sombra de Messi. Porém, muitos criticaram a escolha do jogador pela falta de tradição do clube e pelo nível mais fraco do campeonato francês.
Fofocas continuam
Por volta do mesmo período, Neymar e Bruna Marquezine começaram uma série de idas e vindas em seu relacionamento.
Cada nova etapa e reviravolta da história saia na mídia.
Piada mundial
Em 2016, o técnico Tite assumiu a seleção brasileira para comandar o novo ciclo até a Copa do Mundo que aconteceria dois anos depois. Durante esse período, a equipe conseguiu se recuperar e fez algumas boas campanhas, sempre com Neymar na liderança técnica do time.
Em 2018, com o um desempenho abaixo do esperado no começo da Copa, o elenco inteiro foi muito criticado. Mas, como o camisa 10 da seleção era o principal atleta do grupo e ele não havia entregado o que era esperado, foram diversos os julgamentos em relação à sua participação no torneio. Neymar havia se lesionado no começo daquele ano e não chegou 100% fisicamente na competição.
No final das contas, o Brasil acabou eliminado pela Bélgica nas quartas de final com uma derrota por 2×1. Neymar ficou marcado naquele mundial por ter virado piada global com seus lances exagerados em supostas faltas.
Grandes expectativas, poucos resultados
Mesmo com a imagem de Neymar bastante arranhada pelas zoações da copa 2018 e com um retrospecto de poucas partidas pelo PSG devido à diversas lesões, na Champions league de 2019/20, que ocorreu na época da pandemia, os fãs do jogador começaram um movimento nas redes sociais chamado “#Neyday”. O objetivo era apoiar e torcer para que ele ganhasse aquela competição.
Em dias de jogos, diversos perfis de fãs e veículos de imprensa postavam memes, imagens, vídeos, entre outros exaltando o jogador. Nessa época, torcedores dos mais variados clubes brasileiros mudaram suas fotos de perfil em várias redes sociais para imagens de Neymar com seu icônico moicano e diferentes camisas de time.
A TNT Sports, detentora dos direitos dos jogos do torneio no Brasil, baseava praticamente toda divulgação de jogos do PSG com referências a Neymar e a corrente criada pelos fãs do jogador.
As imagens do atleta chegando aos jogos com seu “kit” composto pela caixa de som e o óculos Juliet também acabaram se tornando icônicos dentro da mitologia do personagem.
Todavia, apesar de ter chegado à final do torneio, o PSG foi derrotado por 1×0 pelo Bayern e o desfecho do movimento foi melancólico para aqueles que torciam pelo o triunfo do jogador.
Um novo “dono” do time
Durante sua passagem pela França, por mais que tenha tido bons momentos e números de participações em gols, o camisa 10 da seleção brasileira passou de esperança da torcida para um problema.
Em média, é comum que um jogador titular de uma equipe faça pelo menos 50 jogos por temporada. Porém, Neymar não chegou nem perto desses números em nenhuma das seis temporadas em que permaneceu na equipe parisiense.
Na janela de transferência em que o atleta brasileiro chegou ao clube, Kylian Mbappe também foi contratado pelo PSG. Na época, ele ainda era apenas uma promessa. Entretanto, esse lugar de protagonismo, que um dia foi ocupado por Neymar, foi conquistado pelo jovem francês, que esteve muito mais disponível para jogar em momentos decisivos e sempre teve excelentes estatísticas.
Além dos problemas com lesões, durante seu período em Paris, Neymar começou a ser cada vez mais associado à festas, baladas, e problemas extracampo. Muitos o acusavam de buscar formas para “escapar” dos jogos em datas comemorativas no Brasil.
Por essa junção de fatores, o amor inicial da torcida do PSG virou uma grande aversão ao jogador brasileiro.
Terceira tentativa. Agora vai?
Em 2022, a seleção optou por manter o técnico Tite para o ciclo desta Copa. Novamente, Neymar era o principal jogador do elenco e maior esperança de muitos torcedores. Porém, era evidente que o carinho que a população brasileira tinha com o atleta já não era mais o mesmo.
Logo no primeiro jogo do torneio, o camisa 10 se lesionou. Ele conseguiu voltar aos gramados depois de um intenso trabalho de recuperação.
O Brasil chegou às quartas de finais da competição sem tantas dificuldades. Nesta rodada, o adversário da equipe era a Croácia, país com pouca expressão no futebol de seleções, mas que havia chegado na final da Copa anterior. Muitos achavam que a partida seria tranquila. Mas, o jogo foi extremamente travado e foi para prorrogação.
No minuto 105, Neymar faz grande jogada pelo meio e abre o placar para o Brasil. O gol foi importante não só pela situação da partida, mas também porque o colocava como maior artilheiro da história da seleção, empatado com Pelé em jogos oficiais. Todavia, a felicidade não durou muito. Faltando quatro minutos para o fim da partida, a Croácia consegue um contra-ataque em velocidade e marca o gol de empate. Assim, o jogo foi para as penalidades.
O Brasil desperdiçou duas cobranças e foi eliminado da Copa novamente nas quartas de final por uma equipe europeia. A grande controvérsia dessas penalidades foi o fato de Neymar não ter realizado nenhuma cobrança. O jogador iria bater o quinto pênalti, mas como a Croácia converteu quatro gols a disputa terminou sem chegar na vez do craque brasileiro.
Partiu Arábia?
Depois de todos os fracassos em âmbito de seleções e clube, tanto a torcida do PSG quanto a diretoria passaram a ver a presença do brasileiro no elenco como um problema. Com isso, o suposto desgaste entre o jogador e Mbappe, também pesava contra Neymar.
Desse modo, Neymar, ainda com 31 anos e muita lenha para gastar na elite do futebol, acabou em um mercado e uma equipe de menor tradição futebolística à nível global.
Devido à essa sequência de fracassos, a imagem do jogador ficava cada vez mais prejudicada, até mesmo entre seus fãs e figuras públicas.
Política e relacionamentos
Já durante a Copa de 2022, havia uma versão considerável da figura de Neymar. Parte disso tem relação com seus posicionamentos políticos e posturas na sua vida amorosa.
No ano desse mundial, também aconteceram as eleições presidenciais no país. Como todos sabemos, o Brasil estava completamente dividido e qualquer pessoa pública que se posicionasse pró Lula ou pró Bolsonaro, era criticada pelos opositores da figura em questão. Nesse cenário, o jogador declarou seu apoio à campanha de Bolsonaro. O que aumentou ainda mais a aversão de parte dos brasileiros com o atleta.
Não foi a primeira vez que o jogador se posicionou politicamente:
Em relação à sua vida amorosa, foram várias as situações nos últimos anos em que o jogador foi associado a diversas mulheres diferentes e até mesmo dar em cima de pessoas compromissadas.
Assim, a fama de mulherengo já não agradava muita gente. Porém, os acontecimentos recentes que envolvem sua companheira mais recente, Bruna Biancardi, geraram muitas discussões na internet sobre o caráter do jogador, que teria traído a influencer em diversas ocasiões, até mesmo com ela grávida.
Dessa forma, o assunto dominou as páginas de fofoca.
Como será o futuro de Neymar?
Se todos os problemas citados até aqui já não fossem ruins o suficiente, o jogador sofreu a lesão mais grave de sua carreira no ligamento cruzado e menisco em uma partida das eliminatórias da Copa de 2026. No momento o jogador está em processo de recuperação, mas ficará fora dos gramados por pelo menos seis meses. Devido à complexidade da lesão e a idade do jogador, muitos condenam que talvez o camisa da seleção nunca mais tenha o mesmo desempenho físico em campo.
Mesmo sem entrar em campo, Neymar continua aparecendo constantemente na mídia com assuntos de sua vida pessoal. A grande esperança para o atleta recuperar o fôlego de sua fama e status de craque é a Copa de 2026, que poderia, numa reviravolta gigantesca, representar a última ascensão de Neymar, caso ele faça uma grandiosa participação e lidere a seleção até o tão sonhado hexa.
Mas mesmo que consiga, há de se perguntar se o gosto de ouro da taça vai limpar o amargo que fica quando pensamos na jornada do menino prodígio que tinha tudo para ser rei, mas tropeçou nos próprios mantos e na soberba da coroa que nunca chegou a pousar em sua cabeça.