Presentes na UFMG desde 1978, os restaurantes universitários são parte importante para a comunidade acadêmica
Por Alice Assis e Alice Alves
Sem aumento no orçamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e no Plano Nacional de Assistência Estudantil, a reitoria estuda reajustar o preço das refeições nos restaurantes universitários. Com a justificativa de não ter verba para cobrir o valor do custo de produção de cada refeição, o órgão planeja um aumento de 67% no preço atual – de R$5,60 para R$9,40. A medida, sugerida em março, ainda não foi implantada, mas já causa preocupação entre os estudantes que frequentam os famosos ‘bandejões’.
“Eu vivo desse bandejão. Eu não sou daqui, sou de São Paulo. Faço estágio de manhã, estudo à tarde e à noite, então o bandejão é a minha única fonte de alimentação. Eu tomo café da manhã, almoço e janto aqui. Com o aumento, vai ficar muito complicado para mim”, contou Amanda, estudante de arquivologia da Federal.
Responsável por atender milhares de alunos diariamente, os restaurante universitários fazem parte do conjunto de ações sociais que visam a permanência de alunos na universidade.
Com o valor de R$ 5,60, aos alunos não assistidos, por cada refeição – almoço e jantar – o atual valor da refeição no bandejão da UFMG já é o maior entre 30 instituições federais analisadas por essa reportagem. Dentre os exemplos, podemos citar algumas das maiores do país, como a UFRJ (R$ 2), a UFF (R$ 00,70) e a UFRGS (R$ 1,30) que possuem valores inferiores.
Administrados pela Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), a UFMG possui seis RU ‘S, espalhados pelos diferentes campis da instituição, que oferecem a todos os estudantes refeições completas no horário do almoço e do jantar, além de cafés da manhã gratuitos para alunos assistidos pela FUMP vínel I, II e III.
Aos discentes nível I assistidos pela Fundação, as refeições são gratuitas. Para os alunos beneficiados nível II e III, o almoço e a janta são fornecidos ao preço simbólico de R$ 1. . Estudantes assistidos nível IV-A pagam R$ 2 e nível IV-B pagam R$ 2,90. Com o projeto de aumento do preço do bandejão, não foi informado como os alunos agraciados pela Fump serão afetados.
Para o graduando em história Thales, o aumento no preço das refeições do RU pode causar um impacto negativo na permanência dos estudantes: “Esse aumento é muito grave e pode atrapalhar a permanência de muita gente aqui na universidade. O bandejão ajuda bastante, e as pessoas podem não ter condições de ficar”
Bandejão e permanência na UFMG
“A minha decisão de me mudar para Belo Horizonte se baseou nas políticas estudantis da UFMG, e no fato de acreditar que essa assistência estaria garantida. O aumento é preocupante. Não sei como vou sobreviver”, desabafou a estudante de arquivologia citada no começo desta entrevista.
Paulista, Amanda é apenas mais uma das alunas que teriam a permanência na UFMG afetada pelo aumento no preço dos restaurantes universitários.
Mesmo durante a pandemia, com a redução da capacidade produtiva, os restaurantes universitários da UFMG serviram 8800 refeições completas diariamente, atendendo a todos os âmbitos da comunidade acadêmica, segundo dados da FUMP.
Associados às outras políticas de permanência, como as moradias universitárias, o auxílio manutenção e transporte, os RUs garantem praticidade e qualidade na permanência de alunos na instituição. “Eu faço as duas refeições (almoço e jantar) todos os dias aqui e não conseguiria manter minha rotina sem o restaurante.” disse Matte, aluno de graduação na UFMG.
De acordo com dados fornecidos pela Fundação Universitária no Relatório Sócio-Economico de 2002 até 2021, o perfil dos estudantes da universidade federal é predominantemente feminino (51,21%), branco (47,92%) advindos de instituições públicas (57,83%), não cotistas (58,62%) e com renda de até 5 salários minimos (58,39%).
Alimentação e saúde dos estudantes
Para além do impacto na permanência dos estudantes na instituição, o aumento no preço das refeições nos restaurantes universitários pode ocasionar problemas na saúde dos alunos.
Segundo a FUMP: “O Programa de Alimentação tem como objetivo propiciar refeições de qualidade, com cardápio variado e balanceado, contribuindo para o bom desempenho acadêmico dos estudantes da UFMG”. Todavia, com o aumento do preço, muitos alunos passariam a buscar alternativas mais ‘baratas’ para manter a rotina alimentar.
“Eu iria para casa para fazer um miojo ou uma comida mais em conta. Eu precisaria sair daqui da UF pra ir lá para casa, e às vezes a gente precisa pegar um ônibus, um outro transporte, que é mais dinheiro pra gente desembolsar. E um tempo livre que eu podia estar lendo, eu teria que ir pra casa fazer comida”, contou André, estudante de Ciência Sociais.
Essa substituição dos estudantes para alimentos de rápido preparo e baixo custo, pode acarretar problemas de saúde e influenciar no desempenho acadêmico e profissional.
Segundo a nutricionista e especialista em gestão de unidades de alimentação Gabriela Ivale Machia: “Uma alimentação saudável e balanceada traz muitos benefícios para todas as faixas etárias, como a redução do risco de doenças crônicas, manutenção do peso corporal, melhora do humor e memória, manutenção da saúde intestinal e sistema imunológico. Porém, os impactos de uma má alimentação por parte dos jovens estão diretamente ligados à saúde desse indivíduo no futuro, podendo haver carência de vitaminas e minerais, ganho de peso, risco de doenças cardiovasculares, diabetes e obesidade.”
Bandejão e desenvolvimento acadêmico
Ligada às políticas de assistência estudantil, os restaurantes universitários acabam tendo um papel central em todo o desenvolvimento acadêmico dos estudantes da UFMG.
Ao servirem uma refeição completa, balanceada e definida por profissionais de nutrição, os bandejões facilitam a vida dos acadêmicos oferecendo uma boa alimentação e um “tempo livre”, pois os estudantes beneficiados pelos RU ‘s tendem a economizar dentro da cozinha.
“Prefiro almoçar aqui, porque já tem tudo pronto e eu acabo tendo mais tempo para dedicar às minhas coisas. Para mim, o impacto não é tão grande, mas não é bom”, contou uma estudante de letras que preferiu não se identificar.
Com menos tempo para se dedicar a suas atividades e passando a optar por alimentos de rápido preparo, o desempenho acadêmico dos alunos da UFMG pode ser comprometido, segundo a nutricionista Gabriela Machia.
“Uma má alimentação pode comprometer a produção de neurotransmissores (noradrenalina, o gaba, a serotonina e a acetilcolina), com a falha na produção o aprendizado pode ser comprometido. A falta de proteínas também diminui a produção de dopamina e adrenalina, com baixa na energia o indivíduo diminui seu estado de alerta, e o desinteresse e sono aparecem em momentos de aprendizado”, explicou a especialista.
Posicionamento da Fump
A partir das problemáticas abordadas ao longo do texto, esta reportagem entrou em contato com a FUMP, que por meio do gerente do Restaurante Universitário, disse não participar das decisões de aumento de preço, que fica a cargo do Conselho Universitário.
O gerente ainda complementou que a fundação apenas fornece os dados dos valores das refeições e do déficit orçamentário. Além disso, a fonte diz não saber maiores informações sobre a decisão final a respeito do aumento e que não pode responder sobre o assunto.