Conversamos com alunos da UFMG que vieram de outras cidades sobre os desafios, surpresas e alegrias de estudar longe de casa.
A comunidade acadêmica da UFMG engloba cerca de 50 mil pessoas, o que faz da Universidade um espaço mais populoso do que 784 dos 853 municípios mineiros, ou seja, mais do que 90% deles. Pessoas de 25 estados do Brasil ingressaram na UFMG por meio da primeira edição de 2015 do Sistema de Seleção Unificada, o Sisu, segundo o Departamento de Controle e Registro Acadêmico. Cerca de 80% dos mais de três mil novos alunos da universidade são das próprias Minas Gerais, mas o órgão não tem informações sobre os municípios específicos do estado de onde vêm esses estudantes.
O certo, percebemos no dia a dia do campus, é que não são todos de Belo Horizonte. E mudar de estado do país ou apenas de município dentro de Minas é certamente um grande desafio para muitos estudantes da Universidade que, de uma forma ou de outra, tentam em alguma medida transformar a UFMG em suas casas.
Para conversar com alguns desses alunos, os repórteres Alexandre Decaris, Gabriel Rodrigues, Kaio H. Silva e Thamiris Rezende circularam pelo campus Pampulha. No final de 2014, Alexandre e Thamiris foram conduzidos aos lugares preferidos dos entrevistados no campus, e o resultado foi uma coletânea de depoimentos capturados em vídeo. Já em 2015, Gabriel e Kaio ouviram outros estudantes e registraram suas histórias em áudio. Agora, você confere as duas produções.
Alexandre e Thamiris
Por trás do vídeo
– Poderíamos fechar o vídeo com “Confidências do Itabirano”. Sabe? Do Drummond. Acho que daria.
– É. Tem aquela música que te mandei. Achei brega, mas acho que serve. Cachoeiro do Itapemirim.
– A do Roberto Carlos? É bonita. Mas, sei lá. Ele já teve seu tempo.
– Na verdade, ele tem todo final de ano.
Esperamos o primeiro entrevistado até as nove da manhã. Não nos lembramos de carregar a bateria da câmera. No dia anterior, havíamos combinado uma seleção prévia dos questionados: Adilson, Leo, Ana, Marina, Brisa e Juliana. Alguém da COPEVE.
Adilson cria, Marina dorme
As entrevistas seriam no local em que os alunos se sentissem melhor, dentre os milhares de cenários que compõem a UFMG. Adilson prefere a CRIA. O fundo ficou laranja nas fotos, nos vídeos, e no gosto. Sentado, como todos os próximos entrevistados, ele foi à vontade nos contando trechos de seus divertimentos na Universidade e em Belo Horizonte. Contou de Congonhas.
Tá acabando a bateria. Acabou. Tá. Deu certo.
– Podemos deixar carregando aqui na CRIA? – perguntei.
Marina escolhe o ComuniCA, por motivos necessariamente sonolentos. Adormecidos. Inertes. Entende? Ela gosta de dormir nos tempos livres. É de praxe que ficaria à vontade sentada no melhor sofá da FAFICH, assim dito por todos, de todos os cursos que por lá passaram e deixaram uma leve marca de repouso. De Sete Lagoas, fala da saudade da amiga-mãe, da prontidão em que realizava o que queria, da independência com que a vida presenteia, sem etiqueta para devolução. Disse dos amigos, com dois deles apontando uma câmera em sua direção.
Com a palavra: Sr. Copeve e Srª. DRCA
“A Comissão Permanente do Vestibular (COPEVE) constitui, no âmbito da UFMG, uma instância apta a atender, com presteza, competência e segurança às necessidades de realização de Concursos Públicos municipais, estaduais e federais. O Departamento de Registro e Controle Acadêmico – DRCA é um órgão auxiliar da Reitoria e está subordinado ao Vice-Reitor. Sua atividade primordial é cuidar para que os registros e os controles acadêmicos sejam realizados de maneira correta, de acordo com a legislação educacional e as normas internas da Instituição.” Fonte: site da COPEVE
Fomos à Unidade Administrativa III entre o fim da entrevista de Marina e o encontro com o Leonardo, que seria o próximo aluno entrevistado. A pé, relembramos o dia da nossa matrícula e lamentamos o calor. Nada de novo sob o sol.
– Fala você, Alexandre. Tenho vergonha.
– Falo. Licença… Moça. Gostaríamos de falar com um representante da Comissão Permanente de Vestibular.
– Andar de cima.
Subimos. Esquerda.
– Licença… Moça. Gostaríamos de falar com um representante da COPEVE.
– Direita.
Direita.
– Licença… Moça. Gostaríamos de falar com um representante da COPEVE. Somos estudantes de Comunicação Social, estamos à procura de uma informação… É rapidinho.
– Só um instante. Vou chamar o Fulano.
Na espera, falamos sobre teatro, sobre o pouco tempo para terminarmos esta matéria – a tal crônica que esperávamos escrever -, sobre o O Livro Amarelo do Terminal, sobre o jornalismo de Vanessa Bárbara e a poesia do mundo.
– Olha, o Fulano está em uma ligação. O que exatamente vocês querem?
– Somos estudantes de jornalismo à procura de informações sobre alunos da UFMG que vêm de fora da cidade de Belo Horizonte. Não, não somos da TV, não, não somos do CEDECOM, é para uma matéria do curso de Comunicação.
– Acredito que aqui não seja o melhor local. Vocês já tentaram o DRCA? Andar de baixo, aí, direta. Sabe? Procurem a diretora, Fulana.
– Sim. Viemos de lá.
Descemos. Direita.
– Licença… Moça. Gostaríamos de falar com Fulana.
A funcionária vira as costas.
– Pedro, querem falar com a Fulana.
Pedro conta, levemente nervoso, que Fulana não tem mais do que cinco minutos.
– Portanto, façam em dois. O que vocês querem?
Contamos a história de novo:
– Somos estudantes de jornalismo à procura de informações sobre alunos da UFMG que vêm de fora da cidade de Belo Horizonte. Não, não somos da TV, não, não somos do CEDECOM, é para uma matéria do curso de Comunicação.
Entramos na sala da diretoria do Departamento de Registro e Controle Acadêmico e tivemos uma breve conversa com a senhora Fulana. Sem muita paciência, ela declarou não ter as informações de que precisávamos.
– Não, esta afirmação quem faz é você. A UFMG não sabe ao certo se a quantidade de alunos do interior de Minas ou de outros estados aumentou com a adoção do Sistema de Seleção Unificada. Na verdade, eles já vinham antes, né?
De fato. No entanto, apenas ligamos a câmera e realizamos duas perguntas básicas. Saímos da Unidade mais rápido do que entramos. Atrasados.
– Ficou tudo fora de foco, Thamiris. Tentei focar enquanto você perguntava, mas acho que não deu muito certo.
Como o personagem criado por Woody Allen em Desconstruindo Harry, onde o desfoque é tomado como um estado de espírito, acreditamos que a entrevistada foi, na melhor das hipóteses, uma personagem des(interessada)focada.
Uma coroa para Leonardo
Rumo à FAFICH, quase perdemos o interno A. O motorista cobrou um “obrigado” por ter nos esperado. Agradecemos na saída, sem pestanejar. Era hora da entrevista do Leonardo.
– Ah, o lugar que eu mais gosto é o hall – ele contou. – Aqui está bom? Gosto dessa árvore.
– Leo, acho que vai ficar ruim, está contra a luz. Vamos fazer em outro local.
Confessamos a intervenção na mise-en-scène. Foi inevitável. Com todos os entrevistados.
Escolhemos o grafite ao lado do banheiro feminino. Após assistirmos ao vídeo no processo de edição, percebemos que havia uma coroa na cabeça do Leonardo. É, o grafite formou uma coroa. Apesar de sensível, não foi proposital. O paulista disse sentir falta dos pais tão loucos quanto ele e mais um pouco. Os amigos daqui preenchem a falta que faz a família. Leo aprendeu a andar de ônibus em BH.
Contou que a saudade aperta, sim. Às vezes, dói.
Um lanche com Ana
Agradecemos Leonardo e esperamos menos de 10 minutos até o término da aula da Ana. Percorremos os corredores, nós dois e a entrevistada, em busca de um local em que ela se sentisse à vontade.
– Não dá para ser no ComuniCA – explicamos. – Nem no hall. Ah! Nem na CRIA.
– Pô, gente. Aí fica difícil, né.
– Ana, pensa em um local ou alguma coisa que você ama fazer. Tem que haver algo fora disso que você goste. Tem várias coisas legais aqui na UFMG, e…
– Eu amo comer.
Convenhamos, a cantina de Faculdade de Letras ao meio-dia não é o melhor local para se gravar uma entrevista. Quando se coloca uma cadeira em frente a uma bancada de salgados, sanduíches, iogurtes, e sei-lá-mais-o-quê, não se pode garantir o conforto do comprador de lanche. De qualquer forma, foi lá que ela nos contou da vida, do Pará, de Goiás, da meia-saudade, de como dormia no CA, mas não mais, de como a UFMG é, “assim, maravilhosa, né?”. Não disse que gosta de comer nas horas vagas. Achamos que o ambiente disse por ela.
Companheiras de quarto
Nos separamos. Alexandre e eu, digo. Assumo o trabalho daqui em diante: era hora do trabalho dele na TV UFMG, havia mais duas entrevistadas e delas cuidaria eu. Brisa e Juliana dividem o mesmo apartamento e os mesmos gostos. Dançam toda quinta-feira à noite no Picadeiro da Praça de Serviços com quem aparecer disposto a “forrozear”.
– Meu cabelo tá ruim. Thamiris, você trouxe a maquiagem? E isso é para quê, mesmo?
Repito a ladainha sobre os estudantes de jornalismo à procura de informações sobre alunos da UFMG que vêm de fora da cidade de Belo Horizonte. “Não, não somos da TV, não, não somos do CEDECOM, a entrevista é para uma matéria do curso de Comunicação. E não, não precisa de maquiagem. O cabelo de vocês está ótimo.”.
Resolvi realizar a entrevista com ambas, pois tinha a certeza de que seriam incapazes de não dar pitaco na fala da próxima. Dito e feito: divertidas, as garotas de Itabirito e Viçosa/Araguaína contaram sobre a saudade e as diversões de uma e de outra.
– A gente pode falar que você também mora com a gente, Thamiris?
– Não, gente. Claro que não, seria estranho, estou entrevistando vocês. Pensariam que não fiz o esforço suficiente para captar informações de alguém que não seja participante do meu dia-a-dia.
No fundo, não entendo bem o porquê de ter dito isso. Elas são exata e gritantemente o que a pauta solicitava, não importando de onde conhecem a entrevistadora.
Gabriel e Kaio
Além do Belo Horizonte
Afastando-nos ainda mais da FAFICH, buscamos vozes em outros lugares do campus Pampulha. Primeiro, falamos com Anaine Anikualo, estudante do quarto período de Odontologia. Anaine passou os seis primeiros anos de sua vida em uma aldeia indígena do Mato Grosso e ingressou na UFMG por meio de um vestibular especial para essas populações, oferecido entre os anos de 2010 e 2013. Esse tipo de vestibular era porta de entrada para seis cursos: Agronomia, Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Enfermagem, Medicina e Odontologia.
No lugar preferido de Anaine no campus, a Praça de Serviços, conhecemos um pouco da sua história, que você ouve agora:
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Já no Diretório Acadêmico do Instituto de Ciências Biológicas, encontramos o estudante de Biologia Jean Ranyere. Interrompemos sua partida de baralho para conversarmos sobre a mudança dele de Teófilo Otoni para Belo Horizonte em 2012. Jean ingressou na UFMG em 2013 e, enquanto pensa em trocar de curso, contou-nos o porquê de ter escolhido a Universidade.
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“Interiores” tem meu coração tanto <3 Já era apaixonada pelo vídeo e adorei a matéria também!