Alunos da universidade que precisam utilizar a linha Move 6350 – Barreiro/Vilarinho relatam as dificuldades enfrentadas para chegar a faculdade e como isso afeta os estudos
Por Wellington Barbosa
O trânsito e a mobilidade urbana em Belo Horizonte impactam todos aqueles que precisam sair de casa e ir para algum lugar da cidade, seja para trabalhar, a lazer ou para estudar. Caso este dos alunos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que utilizam a linha Move 6350 – Barreiro/Vilarinho para chegar à faculdade. São dificuldades diárias enfrentadas que impactam no aprendizado, seja pelo cansaço ou pela falta de tempo para estudar. É o que revela a estudante de história Ana Carolina Santos, que mora na Região do Barreiro e, desde o retorno das aulas após a pandemia, enfrenta uma rotina exaustiva para deslocar de casa até a universidade.
“Os ônibus já vêm lotados da Estação Barreiro, porque saem poucos ônibus de lá. Há gente sentada até no chão, para você ter noção. E eu vou em pé daqui até a UFMG. Tipo, são duas horas em pé. Você chega lá praticamente exausto, fisicamente e mentalmente. A vontade que se tem é de descer no meio do caminho e voltar para casa”, desabafa Ana Carolina.
Para chegar à faculdade, Ana Carolina precisa sair de casa às 17h, esperar o 6350 passar na Via do Minério, no Barreiro, e posteriormente, atravessar um trecho do Anel Rodoviário até pegar a faixa exclusiva da Avenida Antônio Carlos. Um longo esforço que faz para conseguir entrar na sala de aula às 19h. Ela conta que o trajeto é de duas horas na ida e na volta, o que totaliza quatro horas para apenas ir estudar.
É uma vivência compartilhada também por outros estudantes da UFMG que usam o 6350 e convivem diariamente com os problemas existentes. Como a solução não está em mãos, o que cabe para eles é procurar os motivos que expliquem os problemas enfrentados na linha. Entre as principais questões apontadas, está o número de habitantes da capital mineira, que cresceu exponencialmente nas últimas décadas. Consequentemente, é possível imaginar que a quantidade de veículos também acompanhou esse crescimento. É o que revela os dados do Censo 2022, que indicam a existência de mais automóveis do que habitantes em BH, sendo 2.599.029 milhões de veículos contra 2.315.560 milhões de pessoas.
Como apontado pela estudante Ana Carolina, uma das consequências do tempo perdido no trânsito da capital mineira é o esgotamento mental e físico para aqueles que precisam passar tanto tempo nos trajetos entre a casa e a faculdade. Assim, para driblar o impacto no aprendizado e não saírem tão prejudicados, alguns recorreram a outros modos de transportes, como as caronas oferecidas por outros estudantes da UFMG. “Na maioria das vezes, chegava cansada na faculdade, ainda mais que eu ia direto do trabalho. Ficava com o corpo e a mente bem cansada. Com as caronas, consigo ir mais cedo. Com esse tempo que consigo, eu durmo”, destaca a estudante de química Fernanda Lima, que está na UFMG desde 2018.
Mineirão: um complicador
Fernanda mora na Região do Barreiro e também utiliza a linha Move 6350. Como o tempo de deslocamento é muito grande, além de estudar à noite e temer pela segurança no transporte, havia um dia da semana que ela não se matriculava: nas quartas-feiras. Dia em que normalmente acontecem partidas de futebol dos clubes Cruzeiro e Atlético-MG no Estádio do Mineirão, que fica ao lado da UFMG. “Uber é muito caro. Fica impossível de entrar e sair. Antes da pandemia era pior, porque deixavam os torcedores na Avenida Antônio Carlos pegar o ônibus interno para ir ao jogo”, lembra.
Porém, em agosto de 2023, o clube Atlético-MG mudou-se para a Arena MRV, no Bairro Califórnia, Região Noroeste da capital mineira. Esse movimento fez com que apenas o Cruzeiro realizasse partidas no Mineirão. Contudo, essa mudança alterou o fluxo de trânsito no entorno da universidade? Para o estudante de ciências socioambientais da UFMG Mateus Guimarães, que mora no Barreiro, a mudança fez diferença.
“Quando tem algum jogo ou algum evento de grande porte no Mineirão, geralmente tento sair de casa um pouco mais cedo, meia hora ou uma hora mais cedo, depende do horário do evento. O trânsito fica bastante complicado no Anel Rodoviário, que é o único caminho que nós temos para chegar na Pampulha. Agora, não vejo tanto impacto igual tem no dia de jogo no Mineirão”, destaca.
Mateus também ressalta que as caronas ajudam bastante, principalmente em dias de jogos, visto que os motoristas desviam o caminho para evitar o trânsito do Mineirão. Entretanto, o cenário muda completamente quando se vai de 6350, que segue a rota de fluxo dos torcedores. “Eu chego em casa perto da meia-noite, às vezes, até passa de meia-noite. Isso impacta bastante, confesso. Tem dias que você fica numa preguiça — ah tenho que pegar ônibus, vou ficar tanto tempo preso no trânsito — , é um cansaço por causa do percurso”, diz.
Outros problemas
Além do tempo de deslocamento, que é a maior parte das reclamações, o esgotamento mental e físico vivenciado pelos estudantes está associado à qualidade do transporte público, visto que muitas vezes passam o trajeto todo em pé, em ônibus apertados e cheios. “É porta que não abre. Outro dia mesmo, estava chovendo e estava molhando todo o ônibus”, afirma Ana Carolina.
Não apenas esses aspectos negativos, mas a segurança também se tornam um complicador. “Já sofri duas tentativas de assalto. Uma vez durante à tarde, era horário de pico e dois caras vieram me abordar e roubar meu celular, mas não conseguiram. Outra vez, não estava indo para faculdade, mas voltando”, relembra Mateus.
Os relatos dos estudantes não ficam apenas nas percepções diárias. Segundo o painel de controle da Superintendência de Mobilidade do Município de Belo Horizonte (Sumob), o 6350 fica em nono lugar das linhas com mais reclamações entre os passageiros da capital mineira, com 1020 ocorrências, sendo as principais queixas o descumprimento de horário, estado de conservação e funcionamento do ar-condicionado.
O que diz a Prefeitura
Desde janeiro de 2024, a prefeitura vem realizando uma série de ações com a campanha ‘Tolerância Zero’, que já fiscalizou, até o primeiro semestre deste ano, uma média 100 ônibus por dia em BH, com 8.694 ônibus vistoriados, 9.559 autuações, 342 autorizações de tráfego (AT) recolhidas e 13 veículos encaminhados ao pátio. No que diz respeito à mudança do Atlético-MG para a Arena MRV, a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) informou que ainda é muito cedo para medir o impacto do trânsito no entorno da UFMG. “Para afirmar uma queda de fluxo é preciso um recorte maior de tempo. Contudo, novamente, as vias no entorno do Mineirão estão parcialmente interditadas para obras, o que vai impactar qualquer tipo de mensuração esse ano”, explica a BHTrans em nota.
As obras a que a empresa se refere são para a etapa da Stock Car, que será realizada nos dias 15 a 18 de agosto, no entorno do Mineirão. Outro ponto levantado pela BHTrans foi em relação à dinâmica de acesso à UFMG, que mudou com a implementação do Move nos corredores exclusivos da Antônio Carlos, que corta a universidade. Além disso, eles apresentaram o número de passageiros que frequentam as linhas Move, para destacar a importância dos corredores exclusivos para os estudantes que precisam chegar a federal, mas os dados revelam que, especialmente no que diz respeito ao 6350, há uma queda a cada mês no número de passageiros.
Em outubro de 2023, ao todo 113 mil passageiros passaram pelo 6350. Porém, em novembro, o movimento foi de 104 mil passageiros, uma redução de quase 10 mil usuários. Já em dezembro, a queda continuou para 97 mil. No mês seguinte, em janeiro, houve um leve aumento para 98 mil e em fevereiro caiu de novo, desta vez, para 91 mil.
Esses números destacam a importância do 6350 para os alunos do Barreiro que precisam chegar à UFMG, visto que a queda coincide com o período das férias letivas. Entretanto, a linha apresenta diversas reclamações, sejam aquelas levantadas pela Sumob, ou presentes nos relatos e histórias contadas nesta reportagem.
* Reportagem produzida na disciplina Laboratório de Produção de Reportagem sob supervisão da professora Dayane do Carmo Barretos