Estudantes falam sobre a implementação das catracas na Fafich. Segurança e controle são algumas das possibilidades apontadas por alunos da UFMG para explicar a presença de catracas em um ambiente público
Por Gabriela Araújo e Daniel Mendes
Segundo o Inep, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, a UFMG é a instituição que guarda o melhor desempenho entre as federais em 2023. A federal mineira ocupa vaga entre as 10 melhores universidades da América Latina, de acordo com a edição regional do ranking da Times Higher Education (THE). O levantamento apontou evolução positiva no quesito ‘Pesquisa’ e ‘Ensino’.
Em contraponto, as universidades federais tendem a carregar a reputação de ser um antro da perdição, lugar de balbúrdia pura, lar livre do sexo e das drogas. O senso comum já se estabeleceu de tal modo que, sendo até motivo de brincadeira, o estudante da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas é logo associado como ‘maconheiro’, como se as duas características fossem quase que sinônimos, um não consegue existir sem o outro.
A formação de qualidade, com a UFMG mantendo e carregando com afinco a responsabilidade de ser uma das melhores universidades do Brasil e figurando entre as mais qualificadas no mundo, nascedouro de importantes pesquisas, inclusive na crise pandêmica que assolou o mundo inteiro, parece não se estabelecer como plena realidade no imaginário de parte da sociedade.
Se a universidade pública, no caso a UFMG, guarda o estereótipo de ser um lugar em que tudo “mundano” acontece, do que adiantaria a implementação de catracas, especialmente dentro das dependências da Fafich?! Não será uma simples barra de ferro, que não alcança nem metros, que daria um ponto final nos estereótipos.
Segundo a coordenadora geral do Diretório Acadêmico da Fafich, Mariana Oliveira, as catracas foram instaladas com o pretexto de que seriam ferramentas para auxiliar na segurança patrimonial e também na segurança dos alunos. No entanto, a estudante de História na UFMG considera que as catracas não cumprem o papel de proteção; “Hoje, elas servem como um mecanismo que repele a entrada e o uso do espaço da Universidade por não estudantes”, afirmou.
E as drogas que “correm soltas” na Fafich?
“Vídeo registra flagrantes de venda de drogas na Fafich da UFMG”. A reportagem, do Estado de Minas em colaboração com a TV Alterosa, publicada em 2015, trata sobre o “o livre uso de entorpecentes no campus” onde apresenta um vídeo em que negociações de LSD e cocaína são feitas dentro das dependências da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas.
No produto audiovisual, toda a conversa e venda das drogas acontecem dentro do Diretório Acadêmico pelos próprios alunos. Apesar de ter se passado quase uma década, e de não ser mais uma realidade tão comum, o estereótipo se estabeleceu de tal forma que Fafich e drogas como quase irmãs no imaginário popular e até no próprio corpo acadêmico.
A estudante Isabela Ferreira, iniciante do curso de Psicologia que não teve a experiência de conhecer a Fafich sem catracas, imagina que não faça tanta diferença a presença do objeto. “Vocês contaram que tinha tráfico de drogas, eu não duvido muito que um aluno venda, que só venha alguém de fora para fazer isso. Por mais que tenha diminuído, talvez agora os alunos estejam mais discretos. Mas acho que não tenha um aluno que faça isso e quem faz são só pessoas de fora”, disse.
A graduanda traz um argumento válido quando coloca que não são apenas pessoas de fora que vendem drogas dentro do ambiente da faculdade. Talvez seja mais comum que os próprios alunos o façam. Neste cenário imaginado pela estudante, as catracas de nada adiantariam para minar a existência de entorpecentes dentro da Fafich uma vez que, em sua maioria, não é feito por “pessoas de fora”.
Catracas como barreiras?
O impedimento do comércio de ambulantes dentro dos ambientes estudantis é outro ponto que deve ser abordado quando se fala da implementação das catracas. Com preços altos e locais limitados para a comunidade acadêmica, os ambulantes se apresentam como uma alternativa de valores mais em conta que, agora, podem transitar apenas fora dos prédios e não nos ambientes essencialmente públicos.
“Isso deixa a gente sem opção, a lanchonete daqui [Fafich] é muito mais cara que a Engenharia, um café com leite é R$ 2 reais. Acho isso um absurdo. Se a gente está em uma faculdade pública, espera-se que a gente não tenha dinheiro. E deixar de ter uma lanchonete só acaba pondo um valor que somos obrigados a pagar. Porque não vou ter como me deslocar até um lugar mais distante”, aponta a estudante de Psicologia.
Mariana Oliveira, afirma que desde 2018/2019, os estudantes e trabalhadores autônomos, com o apoio de alguns docentes e grande parte do corpo técnico, resistiram à implementação das catracas.
“Apesar de terem sido colocadas pelo pretexto da segurança, todos nós sabíamos que seriam, na verdade, um dispositivo para tornar menos acessível ainda o espaço universitário. Isso, em especial, para os trabalhadores ambulantes e autônomos que foram retirados dos locais em que trabalharam por anos”. A estudante ainda reitera que a decisão, à época, não foi realizada de forma democrática onde os estudantes não tiveram suas vozes escutadas e sim, ignoradas.
Já de acordo com o estudante do 1º período de Ciências Sociais, André Lopes, as catracas foram implementadas pensando na questão de segurança, mas ao mesmo tempo, aponta que não sabe se a segurança está sendo feita de maneira correta uma vez que há a possibilidade de passar pelo portão lateral: “Quem quiser entrar pede ao segurança. As catracas gastam dinheiro que poderia ser investido em outras coisas”, completou.
Amarrar cachorro com linguiça
Se não é por questões de segurança e nem para barrar o comércio de entorpecentes, as catracas servem efetivamente para o quê? Na opinião de Isabela, a ferramenta funciona como controle e uma vez que não servem à função de segurança, não deveriam sequer ter sido instaladas. Em consonância, André considera que as catracas são indiferentes e que, apesar de não serem tão importantes como parecem ser, servem para manter o controle de quem entra e sai.
No entanto, para a estudante de Jornalismo, Mariana de Brito, há um grau de importância na implementação e ativação das catracas não apenas na Fafich, assim como em outros prédios da universidade. “Eu acho importante a implementação das catracas, não só na Fafich, como nos outros prédios, acho que tem sua importância. Ainda que não esteja acontecendo de uma forma efetiva, mas acho que tem sua importância para dar, pelo menos, uma sensação de segurança”, afirmou.
Ela também ressalta que essa importância pode ter relação, de algum modo, com uma sensação de segurança no interior dos ambientes da instituição de ensino, mas que ainda é necessário alguns aperfeiçoamentos no sistema de acesso aos espaços da universidade. “Para mim é mais uma sensação de segurança mesmo. Eu me sinto um pouco mais protegida. Ainda que seja um sistema que tem muito a melhorar, mas acho que é um primeiro passo”, completou.
Já para Mariana, estudante de História, as catracas são totalmente dispensáveis, um investimento alto do dinheiro público que não acompanha nenhuma política efetiva de segurança nas dependências do campus. “Infelizmente, a catraca hoje só serve para afastar as pessoas de entrarem e usufruírem de um espaço público. Quando você vê uma catraca, automaticamente pensa: ‘não posso entrar ou esse lugar não é para mim’, sendo que é para todos nós.”
A reportagem realizou várias tentativas falhas de contato com a diretoria da UFMG e da Fafich para que o ponto de vista da universidade fosse devidamente exposto.
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