por Luiz Lavall, para a Coletiva Pinha!
Valdir trabalha há 5 anos como porteiro na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, mais conhecida como FAFICH. Antes disso, já trabalhou outra dúzia de anos na mesma função em outros prédios públicos da Grande BH. Seu turno é 12/36, isto é, ele trabalha um dia por 12 horas e folga o outro, sem finais de semana e feriados.
“Quando eu me aposentar, vou tentar trabalhar turno normal, 8 horas. Essa rotina assim é muito pesada e quero ter meu descanso no final de semana”.
Sim, Seu Valdir, que já beira os 60, faz planos para o trabalho mesmo quando se aposentar. O salário nunca foi alto e a portaria foi uma das poucas oportunidades que apareceram, já que ele não possui ensino fundamental completo. Parou na 6ª série. Diz querer uns troquinhos a mais para finalmente poder comprar sua casa, já que sempre viveu de aluguel e seu sonho é não ter medo de morar na rua. Mas ele anda preocupado. A empresa da qual era trabalhador tercerizado, a Conservo, não conseguiu pagar seu salário e de seus colegas no final de 2022.Eles resolveram então se mobilizar e pressionar a Reitoria da UFMG. Mas mesmo tendo seu pagamento regularizado, Seu Valdir precisou contrair uma dívida para pagar as contas enquanto esperava o dinheiro. Ele também começou a ajudar Ilton, 52, outro colega de profissão, que foi demitido após estar a frente dessas reivindicações pelos salários atrasados. Ele trabalhava na UFMG há 3 anos e meio. Ilton não conseguiu outro emprego e precisa sustentar três filhos.
Como se já não fosse difícil o suficiente, agora Seu Valdir precisa lidar diariamente com as catracas, que o forçam a ficar em pé por quase toda a sua jornada de trabalho, já que precisa constantemente abrir manualmente a portinhola que fica na lateral das catracas, para alunos sem carteirinha e visitantes passarem. Antes não havia a necessidade de ficar em pé para abrir passagem, já que não haviam catracas.
Há também situações piores e humilhantes, como ele mesmo comentou:
“Não pensaram em como iríamos no banheiro quando implementaram isso [catraca]. A gente tem que chamar um dos guardinhas, esperar que ele seja liberado e o tempo de chegar até aqui. E no dia que a gente tá ruim? Faz como?”
Ficar em pé em determinados horários, como início e fim de turno, ao lado das catracas também dificultam os porteiros a bater seus pontos, que ficam nos computadores bem ao lado de onde estão:
“Tem dia que, por conta do ritmo, a gente até esquece de bater o ponto da entrada e depois tem que se explicar pro patrão”.
Seu Valdir e Ilton não são reais, mas seus relatos sim. A empregadora atual dos porteiros e seguranças na UFMG, a Village, impede que eles deem entrevistas. Esses relatos são frutos da conversa com diversos trabalhadores que atuam nas portarias dos prédios da FAFICH, CAD 2, LETRAS e ECI. Ao ver o grau de displicência para com a instalação das catracas, que mais atrapalham o dia a dia do trabalhador do que ajudam, é possível perceber que:
As catracas vieram pra ficar.
Ficar no lugar do Seu Valdir, no lugar do Ilton, no lugar de todos os porteiros…
E eles sabem disso.
Veja também:
Será apenas mais um barulho?
A quebra da invisibilidade
Sobre os mais impactados pelas catracas