Conheça a história do Viaduto Santa Tereza
Crônica por Henrique Terra e Raíza Albernaz
Capital mineira, cidade boêmia, reduto de boas conversas que atravessam gerações. Em meio aos arcos de concreto armado, muitas histórias para contar. O bom bate papo do mineiro guia sua viagem pelo Viaduto Artur Bernardes. Viaduto Artur Bernardes… Não está reconhecendo, não é mesmo? Posso ajudar você! Para o ilustre Fernando Sabino, tem 50 metros de altura, do topo até o chão. Foi caminho das andanças dos “meninos” do Clube da Esquina. Carlos Drummond de Andrade também passou por ali. Inaugurado em setembro de 1929, no cenário belorizontino é passagem de quem tem uma certa particularidade: “subir Bahia, descer Floresta”, como escreveu Rômulo Pais. Palco de tantas histórias, entre as idas e vindas dos bondinhos, a parte de cima sempre cumpriu o seu papel, já a parte de baixo… Mas o que tem ali embaixo?
Antes que eu coloque essa outra pergunta, vou responder a primeira. Se não reconhece o local que eu apresento, agora é a hora de acabar com a sua incerteza e curiosidade. Falo do Viaduto Santa Tereza, com seus 390 metros de extensão, 13 de largura e verdadeiros 14 de altura – Sabino que me perdoe. O mais conhecido viaduto de Belo Horizonte, que por muito tempo teve como os seus principais destaques a arquitetura e sua importância logística, mas que, de um tempo pra cá, se tornou ainda mais relevante para a cidade pelo que tem na sua parte inferior. Mas nada de inferioridade, muito pelo contrário, o que veio de baixo do viaduto é cativante, cultural e desbravador. Mas, então, o que tem ali embaixo? Hoje? Obras. Mas antes… muitas coisas estiveram e aconteceram por ali.
Foto: Acervo/Escritório Técnico Emílio H. Baumgart
Junto à extensão de concreto, um emaranhado de conversas e histórias. Prosas capazes de reviver uma época quase esquecida, mas que ainda habita muitas memórias. Com chapéu na cabeça, cigarro na mão, dono de uma barba, diga-se de passagem, muito por fazer, Délio, um ex-funcionário da Secretaria Municipal de Cultura, é figurinha carimbada em um dos bares que compõem o subsolo do Edifício Central. Com seu visual marcante, entre uma tragada e outra, o comerciante reviveu comigo as suas lembranças. O Arco das Artes, resgatado por Délio, preenchia o espaço do viaduto com apresentações, normalmente realizadas nas sextas-feiras à noite. Pareciam ser encontros muito bons. A memória de Délio falhou, mas foi difícil esquecer que por ali passaram Jards Macalé, Vander Lee e Lô Borges. Infelizmente, ter dinheiro era necessário e, sem recursos, a sua morte foi inevitável.
Após o Arco das Artes, de projetos o viaduto não ficou órfão. As ideias passam, mas o lugar fica. Permanece também sua disponibilidade de receber novas pessoas, sempre de braços abertos. O viaduto é assim… Me atrevo a personificá-lo como um ser humano, é como se o espaço tivesse vida própria, um poder de sedução aliado à sua personalidade multifacetada, que entre concreto e pichações, histórias e grafites, entre ritmos e músicas, atrai os olhares de quem passa por ali e enxerga um lugar para chamar de seu.
Foi assim com os grupos de Hip Hop que usufruíam do espaço para ensaiar e fazer os seus shows no início do novo milênio. Tempos depois, uma turma encontrou nesse lugar o local ideal para criar raízes e crescer. Deu certo! Tanto que levou muitas pessoas de vários cantos da Região Metropolitana de Beagá a frequentar esse ambiente miscigenado nas sextas à noite. Mas nem tudo foi calculado e ali estava o viaduto, dançando mais uma vez conforme a música. O ritmo da vez? O improviso do Duelo de MC’s! Para essa turma, o Viaduto Santa Tereza veio por acaso. Vamos ao raciocínio: Duelo + Praça da Estação + noite de chuva = procura-se uma alternativa! E adivinhem qual foi? “Vamos esconder no viaduto!”, alguém gritou, disse Pedro Valentim, vulgo PDR, ao me contar essa história com todo o orgulho de quem foi uma importante engrenagem de tudo isso. E foi aí que o grupo começou a se despertar para o espaço muito engraçado, que não tinha luz, não tinha nada.
O Duelo fez dele evidência, se tornou o espaço de maior referência cultural e política da capital. Levantem a voz, lutem, batalhem como verdadeiros guerreiros em um combate onde se defende o seu povo!
Não havia cortinas que se abriam e fechavam, mas existia espetáculo. Prova de que o charme do viaduto vem não só da parte de cima, mas também do que existe em baixo, nos bastidores, quando a cidade dorme ou finge descansar.
Oh, Sabino! Já sabias tu que o Viaduto Santa Tereza era bem maior do que se via! Alguns metros para cima que começaram a ser contados de baixo, quando subir e descer eram Bahia e Floresta. Hoje, pena que não posso lhe fazer o convite, mas se pudesse, depois de uma caminhada ao ar puro que as árvores do Parque Municipal nos entrega, lhe convidaria para subir e descer de novo, mas, desta vez, o próprio viaduto. Esse de dois lados, dois hemisférios, que é só um, mas tem dois gumes.