Brinquedos dignos de filme de terror decoram ferro velho na Pampulha e causam espanto em quem passa.

Assustadoras.

Feias.

Horrorosas

Estranhas.

Coisa do trem ruim.

É assim os vizinhos e quem passa descrevem as bonecas instaladas no portão da reciclagem Monte Sinai, no número 392 da rua Boaventura no bairro Liberdade, na região da Pampulha.

Quem já passou pela rua, com certeza, não deixou de notar essas coisas pendurados. Assim como esta repórter, que procurando um novo lugar para morar se deparou pela primeira vez com as medonhas bonecas há dois anos, olhando apartamento bem pertinho da reciclagem.

Reciclagem Monte Sinai

Os moradores da região afirmam que já se acostumaram com a presença das bonecas, apesar de não serem particularmente fãs da ideia de tê-las ali. Na aula escola vizinha à reciclagem, a recepcionista Nayara Leal conta que os alunos costumam comentar sobre as bonecas e até “tirar selfies pra colocar no status”, mas rapidinho se acostumam. Já os funcionários, até se esquecem delas.

A comerciante Ângela Patrícia, que cuida da lanchonete próxima, também se acostumou, mas ainda acha que as bonecas são muito feias. “É horroroso, ridículo. Parece uma casa mal assombrada”. Ela chegou ali depois das bonecas já instaladas e diz que estão ali tem um bom tempo: “Nos acostumamos com esse monte de boneca feia.”

Mas há quem goste das bonecas. O estudante Gabriel Dutra diz que vê nelas uma expressão de criatividade: “É uma forma de reciclar pra decorar.” E aponta a semelhança do lugar com a Ilha das Bonecas no México (acesse o link por sua conta e risco).

Próxima a duas escolas infantis, Escola Municipal Aurélio Pires e Escola Municipal Henfil, as bonecas são menos apreciadas pelas famílias das crianças do bairro. As crianças se assustam, mudam de lado da rua e tem responsável que prefere nem passar por ali. É o que conta a proprietária da reciclagem, Eliene Rocha. Ela também revela a inspiração para a fachada que divide opiniões.

Eliene na reciclagem Monte Sinai, da qual é dona com o marido, Juarez

Quando conheceu o marido, Juarez Xisto, também dono do local, ela o levou para conhecer  seus parentes em São Paulo, e lá passaram em frente a um ferro velho onde viram uma coleção de bonecas dispostas na frente do lugar. Juarez viu aquilo e disse que queria fazer igual. Dito e feito, há seis anos toda boneca que aparece no meio do lixo vai pro portão.

O ferro velho que inspirou Juarez provavelmente foi o do bairro de Campo Limpo, na cidade de São Paulo, que possui uma coleção gigantesca de brinquedos diversos, além das bonecas, e já foi tema de várias outras reportagens como esta e esta.

Elaine conta que o “plano de marketing” do marido deu certo, depois de colocar as bonecas lá a clientela da reciclagem aumentou. “Antes ninguém sabia da gente, aqui é muito escondido. Mas com as bonecas o pessoal começou a aparecer e trazer mais coisa.” Mais coisa significa uma infinidade de lixo reciclável que durante a entrevista a Elaine separava por material e cor. A Monte Sinai funciona como uma triagem, eles recebem e compram o material, organizam e revendem para uma empresa maior que de fato o recicla. O que chega vem da compra de catadores e de outros lugares como da UFMG, que revende livros danificados das bibliotecas para o Monte Sinai. Há ainda doações de quem passa pela rua e identifica ali um ponto de coleta.

As bonecas que adornam a reciclagem também vem, hoje, em sua maioria de doação. Algumas pessoas veem a fachada e depois voltam com suas bonecas velhas para Elaine e Juarez. Desde o começo do ano algumas bonecas se destacam por estarem mais limpas e inteiras que as outras, e por estarem em túnicas brancas.

Elaine diz que por serem de pano e estarem com as roupas brancas, reforçou-se na região o boato de que as bonecas são de alguma forma ligadas à “macumba”. Ela ri e diz que não liga, assim como não se importa com qualquer outro comentário feito sobre as bonecas, uma vez que estas são a marca registrada do seu negócio.

A Elaine pode até não ligar, mas pra mim, que ainda revejo essas gracinhas sempre pelas janelas do 5401 (São Luiz – Dom Cabral), não ‘rolou’ de morar ao lado das possíveis namoradas e filhas do Chuck.

Naide Sousa

“Fazer jornalismo pra escrever uma creepy pasta”