Por Maria Eduarda Cardoso
Com a entrada de calouros no início e no meio do ano, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) recebe estudantes de várias partes do Brasil. Por esse motivo, os que vêm de outras cidades precisam, na maioria das vezes, sair à procura de moradia. De acordo com o relatório de ‘análise do perfil socioeconômico dos ingressantes matriculados na UFMG no período de 2003 até 2022’ do Setor de Estatística da Pró-Reitoria de Graduação da UFMG, no ano de 2022, havia cerca de 34,66% de ingressantes vindos de outros estados e do interior de Minas Gerais, enquanto que os estudantes provenientes de Belo Horizonte representavam 44,22% dos ingressantes. Não é à toa que os bairros do entorno do Campus Pampulha da UFMG possuem um número elevado de universitários.
Com a alta demanda de moradia todo início de semestre, os bairros Jaraguá e Indaiá são uns dos mais procurados para aluguel de apartamentos ou casas pelos universitários já que são bem localizados e ficam perto do bairro Liberdade, que é o mais próximo da Portaria 1 da Federal. Nesse sentido, foi realizada uma reportagem com foco na mobilidade nestes dois bairros bem conhecidos por terem muitos alunos da UFMG: o Jaraguá e o Indaiá.
Os dois bairros carregam algumas semelhanças e diferenças. Eles foram escolhidos por serem bairros procurados por estudantes e terem localizações próximas do campus Pampulha, porém, alguns moradores do Indaiá podem estar mais próximos da Avenida Antônio Carlos e, consequentemente, mais perto da universidade. Enquanto o Jaraguá é um pouco mais afastado.
Apesar do Jaraguá e do Indaiá serem bairros próximos à UFMG, quem mora nas intermediações normalmente não possui alternativas para ir à universidade, a não ser a pé ou de carro, seja próprio ou de aplicativo. As linhas de ônibus que passam nesses bairros, na maioria das vezes, são inviáveis para ir para a Universidade, já que não entram dentro do campus e, na maioria das vezes, o estudante, de toda forma, vai ter que andar bons minutos para chegar ao destino desejado.
Além de que, com a falta de transporte público, estudantes do período noturno que não possuem veículo próprio dependem de caronas ou carros de aplicativo caso não queiram voltar a pé para casa nesses horários com menos iluminação e movimento nas ruas.
Outra situação que pode ser pensada na experiência dos moradores desses bairros é a insegurança ao realizar o trajeto universidade-casa. Nos últimos meses, vem ocorrendo uma onda de assaltos na Av. Antônio Carlos, causando medo nos moradores da região. Os universitários que moram no Indaiá e no Jaraguá precisam atravessar a avenida para chegar na UFMG e ir para casa, ou seja, ficam à mercê dos acontecimentos.
Para apurar se os problemas de mobilidade são reais e se são um incômodo para os universitários, foi realizada uma pesquisa por meio de um questionário com alguns moradores que se prontificaram a responder as perguntas sobre o ir e vir dos bairros até a universidade. O questionário ficou aberto do dia 21 até o dia 26 de setembro e foram coletadas 77 respostas que ajudaram muito a ter uma amostra de como os estudantes vão até a UFMG, se possuem algumas ressalvas em relação ao trajeto, quais meios utilizam, como é a segurança, se há a falta de transporte público etc. Confira abaixo os resultados.
Para aqueles que responderam ‘Não’ ou ‘Depende’, demos um espaço para que eles dissessem o porquê de não se sentirem seguros ou porque ‘depende’. Tiveram 57 respostas. Muitos disseram que depende do horário para se sentir seguro, muitos citaram os assaltos da região, as ruas mal iluminadas, pouco movimento à noite etc.
A suspeita dos estudantes terem receio de voltar para casa durante a noite estava correta, assim como o medo dos assaltos na Avenida Antônio Carlos. Sem contar que, algumas das pessoas que responderam não só ouviram sobre o que vem acontecendo, mas também já foram assaltadas. Nesse caso, a pessoa se arrisca a ir a pé ou tenta alguma carona ou carro de aplicativo, tendo que desembolsar um valor a mais para se sentir seguro.
Para aqueles que se sentem desmotivados, foi questionado o motivo. Entre os destacados, novamente apareceu o medo, insegurança, perigo e segurança.
Para aqueles que responderam que conhecem ou utilizam, foi deixado um espaço para que dissessem quais linhas. Entre as respostas, foram faladas sobre a linha 8551, a 503, 504, S53, 5401 e o Move. Uma pessoa falou sobre a grande volta que uma das linhas faz e outra disse que o ônibus realiza apenas uma pequena parte do trajeto dela.
Nesse caso, principalmente quando colocamos lado a lado a mobilidade com a segurança de ir e vir, a UFMG poderia fazer algo por seus alunos, entendendo as dificuldades, os receios e histórias que rondam a experiência dos universitários.
Para se obter um olhar mais específico ou pessoal, entrevistamos uma estudante sobre o tema. “Em alguns momentos as ruas ficam bem vazias, com pouco movimento, então isso causa uma insegurança, principalmente por ser mulher” diz Júlia Lucca ao ser perguntada sobre se sentir segura no trajeto até a universidade. Segundo Júlia, à noite é o período em que ela menos se sente segura realizando o trajeto.
Júlia Lucca é estudante de Relações Públicas e moradora do bairro Indaiá. Ela veio de Inhapim, interior de Minas Gerais, para estudar na UFMG. Júlia mora no Indaiá há 1 ano e 1 mês e disse que o bairro foi sua primeira escolha ao procurar moradia. Normalmente, ela frequenta a UFMG de manhã, à tarde e à noite e faz o trajeto casa-universidade a pé ou de carro de aplicativo. A pé, ela leva cerca de 20 minutos para chegar ao destino e de carro, 10 minutos.
Ela diz se sentir desmotivada para ir até a UFMG a pé, “Mesmo que seja perto tem vários fatores, como andar sozinha pelo trajeto pouco movimentado, calor, peso dos materiais que tenho que levar para a faculdade…”. De fato, essa desmotivação é muito comum entre Júlia e os outros estudantes que relataram os mesmo problemas no questionário. Outra semelhança, é que assim como os outros moradores do Jaraguá e Indaiá, a Júlia não conhece linha de ônibus que faça trajeto similar ao dela, mas se caso tivesse alguma que entrasse no campus, ela gostaria de usá-la.
Para uma rápida comprovação da falta de linhas de transporte público que realmente valham a pena, no Moovit, foi colocado como ponto inicial a rua de Júlia Lucca e como destino final, a FAFICH. As opções dadas são impressionantes, você consegue pegar a linha 8551 e andar 15 minutos (sendo que a pé até a FAFICH são por volta de 24 minutos) ou pegar dois ônibus diferentes para chegar a um destino que não é longe de casa.
Além disso, também foi feita a lógica reversa, a FAFICH como ponto inicial e a rua de Júlia Lucca como destino, acontecendo mais uma vez o mesmo problema: ou pegar um ônibus e caminhar bastante ou andar em duas linhas diferentes. Com a passagem de ônibus em Belo Horizonte custando R$4,50, ao pegar dois ônibus para a universidade, Júlia gastaria 18 reais por dia, um valor alto para pagar todos os dias.
Figuras 18, 19, 20 e 21 – Rotas de ônibus sugeridas para ir da FAFICH até o Indaiá.
Para o Jaraguá, foi escolhido um ponto aleatório no bairro, a Rua Cacuera, 769. A partir disso, foi realizada a mesma busca no Moovit, tendo a rua escolhida como ponto inicial e, dessa vez, o Instituto de Ciências Biológicas (ICB) como destino final.
Outra vez foi feita a lógica reversa, o ICB como ponto inicial e a rua escolhida no Jaraguá como destino final.
A partir das investigações, pode ser observado que realmente há a falta de linhas de ônibus que atendam o campus da UFMG e os bairros dos arredores. O estudante que mora nos arredores do Indaiá e do Jaraguá pode até fazer a utilização de alguma linha, mas ela não realiza o trajeto completo, o estudante de toda forma precisa andar em alguns momentos para ir até em casa ou até a universidade. Nesse caso, se o universitário utiliza as linhas por alguma insegurança ao longo do trajeto, o transporte público não dá conta de resolver o problema, visto que, de toda forma, a pessoa terá que realizar parte do caminho sozinha.
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